sexta-feira, 13 de junho de 2014

E agora José? - Drumond

E agora José?
Você já fez quase tudo o que quis,gastou sua vida com suas paixões,se rodeou de pessoas,e agora a idade chegou.
Não que o avançar da idade seja sinônimo de falecer,mas a realidade é que um dia todos iremos passar por isso e estamos caminhando pra esse momento.
E se aproximando do fim,onde sua força não é mais a mesma e os pensamentos não são mais os mesmos e os gostos não são mais os mesmo e dos amigos,não sei quantos ficaram. E agora,José? 
E na hora que se for,nada vai levar,seus livros ficarão na estante empoeirando-se,seu terno será de pano e seu fim será abaixo do pó.
O que tem feito de sua vida jovem José?
O que valerá a pena? O que irá levar? Como você será lembrado pelos próximos?
José,quem é você José?

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?

Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio – e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse…
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?

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