domingo, 27 de abril de 2014


"Muitos de nós vivem com o peito mais encharcado que roupa esquecida na máquina de lavar, com a torneira aberta. Mais inflado que chester do almoço de domingo. Tem afeto chorando lá dentro, declaração de amor enxovalhada. Raiva presa com rolha na garganta. Desejos desnutridos. Saudade e lembranças mergulhadas em um balde de água sanitária.
Tudo para esquecer, eliminar manchas de experiências marcantes e sensações da história pessoal. A ordem é deixar bem longe o que nos sufoca. Escondido das nossas desconfianças. Inalcançável por nossas percepções.

A gente sente mas não fala. Põe cadeado em pensamento. Vai empurrando as semanas no calendário com a barriga estufada de mutismo doentio. O corpo começa a inchar, vem a falta de ar e ninguém entende o porquê de tanta agonia.

O coração anda molhado, sabemos. Mas tem silêncio que já empedrou nas bocas murchas de afeto. Ele espera ser arrancado a fórceps, que seja, do mundo das delicadezas esquecidas. Ele espera nascer bonito em nossos gestos, vontades e discursos.

Há pessoas que morrem com a boca cheia de formiga. Outras sufocam com multidões de palavras mesquinhas ou egoístas, presas na garganta. Há os que se asfixiam de amores mal ditos. Ou malditos, como queiram.

Ainda os que desconhecem as delícias, tão íntimas por exemplo, da sensibilidade de alguém, como o poeta Mario Quintana. De vez em quando, entre sorrisos, ele deixava escapar: “A melhor coisa é morrer de amor e continuar vivendo”."

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